quarta-feira, 8 de junho de 2011

Entre tapas ...


Diz a música popular que as relações afetivas entre um homem e mulher se dão entre tapas e beijos. Em “Danaides”, nova produção do grupo brasiliense Basirah, esta relação se dá apenas entre tapas. Há uma luta de poder entre os dois gêneros, com o uso da força e da submissão para ganhar esta guerra.

Um verdadeiro exército feminino entra em cena, no inicio do espetáculo, que estreou no último dia 2 de junho no espaço da Funarte, em Brasília, e fica em cartaz até o próximo dia 12 de junho. A obra tem como núcleo a história das filhas de Dânaos, que assassinavam seus noivos nas noites de núpcias. Elas têm o poder. E assim o parece, quando aquele batalhão, com os rostos cobertos por mascaras brancas, surgem no palco. Todas de salto alto: quer algo mais feminino e, ao mesmo temo, mais poderoso que isso?

O figurino é impecável, nos tons preto e cinza, com alguns toques brancos – roupas extremamente femininas, mesmo quando a bailarina usa calça. É, inclusive, um dos pontos fortes da obra: o cuidado com o cenário (Roustang Carrilho) e com o figurino (Eduardo Barón). O palco está montado com um linóleo vermelho ao centro e cadeiras, também vermelhas, ao redor, onde os bailarinos sentam e assistem as cenas, lembrando algumas peças dirigidas por Zé Celso Martinez.  Por vezes, dá a impressão de ser um ringue... com o sangue vermelho derramado.

As bailarinas entram em cena com força e, muitas delas, têm na expressão facial esta força cênica. São comandadas ao som de estalos de dedos. Unidas. Mas, por vezes, se tornam submissas aos homens, que mandam que façam isso ou aquilo. Mostrando que, ao contrário do mito, na sociedade atual, estamos em permanente conflito com o sexo oposto.

Algumas cenas da obra são belíssimas: como quando três delas entram ao fundo, carregando ramos de suplicantes – como na narração de Ésquilo para o mito (As suplicantes). Outra cena interessante é a que se dá nas cadeiras, com jogo de corpo de homens e mulheres.

Mitos e ritos estão presentes no nosso universo o tempo todo e, como na natureza nada se cria, tudo se copia, a obra de Giselle Rodrigues (diretora do grupo) por vezes faz referências a outras. É nítido, em dois momentos, “A sagração da primavera”, na versão de Pina Bausch, tanto com o ‘sangue’ no chão, quanto na roda de luta entre homens e mulheres – que faz lembrar outro ritual, o da escolha da virgem.

Interessantíssima também a cena da automutilação das mulheres, que se costuram: boca, peito, sexo, e uma delas, deixa-se machucar, com o sangue escorrendo pelo corpo. Atenção: as cenas, muitas delas, são fortes e, por isso, o espetáculo não é recomendado para menores de 16 anos. Outro soco no estômago é a degola dos homens (em As suplicantes, estão preparadas para matar ou morrer, numa repulsa descomunal a qualquer intimidade com os homens).

A obra peca, no entanto, por excessos. Em alguns momentos há elementos demais em cena, que interferem na leitura e confundem: rostos cobertos e descobertos, tubos, punhais, etc. A cena dos balões, por exemplo, explicita, ao seu final, o que já tínhamos entendido. Redunda, sem ser necessário.

Faltam também contrapontos. A obra inteira é densa e tensa, que acaba por ser linear. Como não ocorrem contrapontos, a solução para o final é voltar ao começo, com o exército e as máscaras. Ufa! Sabemos que acabou. E saímos do teatro mais pesados que entramos, pensando na Lei Maria da Penha e em todas as violências que homens e mulheres insistem em manter em suas relações – pessoais ou profissionais.



O que: Danaides

Quando: Até 12 de junho

Onde: Teatro Plínio Marcos – Funarte Brasília

Quanto: R$ 20  

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