domingo, 25 de março de 2012

Piegas, mas real



O filme “Duas vidas” (de Jon Turteltaub) conta a história de um homem que, ao fazer 40 anos, repensa sua vida. Quem nunca passou por isso? A vida que se tem e a que se queria ter é o tema de “A mecânica das borboletas”, em cartaz no Centro Cultural Banco do Brasil até 8 de abril.
A obra de Walter Daguerre foi criada quando ele esteve em Cerro Branco, no interior do Rio Grande do Sul, e ficou pensando o que seria aquela vida de laçar cavalo, aquela vida de fazenda, em contraste com a sua, cosmopolita. A partir desta dualidade, Daguerre se utiliza da lenda de Rômulo e Remo para soltar suas metáforas a respeito das nossas escolhas e da construção dos nossos impérios.
“A mecânica das borboletas” aborda estes temas contando a história de Rômulo,  vivido por Eriberto Leão, que volta para casa 20 anos depois de sair em busca do sonho de desvendar o mundo. Ele reencontra o gêmeo Remo (Otto Júnior), que manteve o negócio do pai e prosseguiu no mesmo ofício, no mesmo lugar, e que tem o sonho de ter uma Harley Davidson, que usará para a sua vigem. Mas falta ainda a borboleta do carburador...
Por horas, o texto parece piegas, mas Daguerre tem boas tiradas – e nos leva a rir das situações da  vida. Quem nunca repensou sua vida? Quem nunca comparou a sua vida com a dos seus irmãos? Mesmo soando piegas, “A mecânica das borboletas” é universal e, no conjunto, é a encenação é boa – apesar de algumas escolhas estéticas questionáveis.
O cenário tenta retratar o espaço da história e dispõe de recursos para desenrolar o enredo. A luz marca as passagens. A trilha sonora pontua os momentos de tensão e de embates mas, no final, é óbvia, com Jorge Dexler e a referência ao filme “Diários de uma motocicleta”. Referencias, inclusive, é um dos recursos mais usados pelo dramaturgo ao longo de toda a história.
Outra escolha estética é a da direção (Paulo de Moraes), que usa em seus atores um tipo de impostação de voz que soa falsa. É como se o texto estivesse apenas saindo da boca para fora, sem verdade. Este elemento é gritante na primeira cena, mesmo na fala de Suzana Faini, atriz com longa trajetória, que faz o papel da mãe. Por vezes, é como se estivéssemos assistindo um vídeo com um delay entre a voz e a interpretação. Os momentos de verdade parecem, somente, os de fúria. No desenvolver da peça, a interpretação vai se acertando – exceto no caso de Ana Kurtner, que parece ter uma batata na boca – e os textos não soam mais como da boca para fora. Ou somos nós, espectadores, que nos acostumamos?
Apesar de alguns poréns, vale a pena sair de casa para ver a peça. É uma obra leve, mas que tras algumas reflexões. Típico programa de domingo. Mas nada que se aplauda em pé.

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