domingo, 18 de março de 2012

Eterna Pina

Como não deixar os olhos marejarem diante de "Ikiru", o solo de Tadashi Endo que faz uma homenagem à Pina Bausch? A obra, que estreou em 2009, e chegou ao Brasil no ano seguinte, veio a Brasília neste final de semana, na Caixa Cultural. Daqui segue para Fortaleza, onde será apresentada sábado e domingo que vem, no Teatro José de Alencar.
Na tradução para o português, Ikiru significa vida. Ao celebrar os mortos - seus mestres, Pina (2009) e Kazuo Ohno (2010) -, o bailarino japonês celebra a vida. Mais que uma homenagem à Pina, é uma releitura de "Café Müller", obra-prima da alemã, que estreou em 1978.
"Quando assisti Pina Bausch em 'Café Müller' - cega e incerta, fraca mas forte, para ultrapassar todas as barreiras (cadeiras) com o desejo impertubável de alcançar sua meta, eu fiquei impressionado!", diz o coreógrafo. Então, seu solo começa com ele sentado, com os braços esticados, como no caminhar de Pina em "Café Müller". Veste-se com uma roupa japonesa e dança o seu butô e, aos poucos, vai saindo desta roupa e desta movimentação leve e lenta e vira. Está então com uma daquelas camisolas que Pina tanto gostava e seus braços falam tanto quanto falavam o da alemã. Debate-se, então, também na sua "cegueira", mas não em cadeiras e, sim, em uma placa de alumínio que é o seu cenário. Faz-se um estrondo. E aquele ruído é muito mais forte e impactante que as cadeiras de Pina. É a cara dada à tapa, é o corpo se esfacelando.
As mudanças de nuances (e a passagem do butô para a dança-teatro) vão se dando junto com as de roupa, que vão diminuindo. Até que ele cai nu no chão, com os braços estendidos - os braços de Pina. E na penumbra do palco vemos ela, em "Café Müller". Uma bela reverência. Na hora de agradecer, antes de vir a nós, que estamos ali, com os olhos marejados, pensando nesta vida curta que temos, na solidão de Pina e dele em cena, em tudo isso e mais um pouco, ele faz com um corpo a reverência a ela e, então, se entrega a nós, mortais, para os aplausos. Simplesmente lindo. E eu fico me perguntando: por que essa alemãzinha, tão frágil e ao mesmo tempo tão forte, nos deixou tão cedo, se ainda tinha tanto a nos dizer?

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